quinta-feira, 25 de junho de 2020

VEJA NA INTEGRA A MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO À SOLICITAÇÃO DA ENTIDADE CCDDHDS “DOROTHY STANG”



Autos nº 62.0466.0000432-2019-3


vistos
 Trata-se de e-mail recebido no dia 15 de junho de 2020, por volta das 15h01minutos, do Centro de Cidadania, Defesa dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social “Dorothy Stang”, noticiando os tramites dos trabalhos referentes a “Revisão do Plano Diretor III” do Município de Valinhos, destacando a notícia de que documentos da 6ª etapa estão disponíveis para consulta pública no site da Prefeitura Municipal e possibilidade, em breve, da divulgação da 3ª Audiência Pública, com objetivo de apresentar e discutir o relatório da Etapa 7 que contempla as Minutas de Lei do Plano Diretor e da Lei de Uso e Ocupação do Solo, sobre o que vislumbra a dificuldade de efetiva participação popular na referida audiência pública pela incerteza de que todos os interessados tenham acesso a tecnologia necessária.

                        A disponibilização eletrônica do material não traz nenhum embaraço ao seu conhecimento, posto que a sociedade civil organizada é dotada de todos os meios de acesso a estes documentos; invariavelmente, as pessoas interessadas e com grau de instrução suficiente a compreender o que está escrito tem acesso a tecnologia necessária e podem explicar aos menos favorecidos técnica e intelectualmente as vantagens e desvantagens do plano diretor.

 Por outro lado, assiste razão ao postulante quando alude as dificuldades da participação popular efetiva e esta deve ser garantida amplamente e para todos, leigos, técnicos, intelectuais ou não; aliás, destina-se a audiência pública exatamente para ouvir o senso do cidadão comum e não de classes profissionais e especializadas na matéria urbanística. Afinal, o bem-estar da moradia é direito de todos indistintamente.

                               As reuniões presenciais estão suspensas, e nem parceladamente e com poucas pessoas, é recomendável. Por esta razão, o próprio Executivo Municipal edita notas técnicas para garantir o distanciamento social e, inclusive, o Legislativo Municipal criou regras de restrição da circulação e atendimento dos cidadãos.

                        A elaboração e revisão do Plano Diretor já está atrasada de há muito, inclusive objeto de ação civil pública, não sendo mais dois, três ou quatro meses, o tempo definitivamente de mora ou retardamente da sua conclusão.

                        Assim, por ora, em nome do princípio da efetiva participação popular nas discussões do Plano Diretor, acolho a reclamação apresentada e determino oficie-se a Sua Excelência o Prefeito Municipal, recomendando a suspensão dos trabalhos externos, vale dizer, de discussão popular, dos trabalhos de Revisão do Plano Diretor de Valinhos até o fim da situação de pandemia e acordo com o Plano São Paulo de abertura das atividades não essenciais.

Dê-se ciência deste despacho ao postulante e cumpra-se com urgência.

Valinhos, 15 de junho de 2020.

Denis Henrique Silva
Promotor de Justiça Designado
4ª Promotoria de Justiça de Valinhos

SOLICITAÇÃO - MP DIREITO À INFORMAÇÃO -



EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DA 4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE VALINHOS



O Centro de Cidadania, Defesa dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social “Dorothy Stang” tem a honra de dirigir-se a Vossa Excelência, e o faz por meio de seu representante legal, a fim de prestar informações referentes à “Revisão do Plano Diretor III”, do Município de Valinhos, em andamento.
Como é do conhecimento de Vossa Excelência, os munícipes de  Valinhos vêm tentando com grande dificuldade participar das várias etapas da revisão do referido Plano Diretor III, conforme está previsto na Lei municipal nº 3.841/2004 Art. 3º, que afirma que o processo de elaboração, implementação e execução do Plano Diretor deve ser participativo, nos termos do art. 40, § 4º e do art. 43 da Lei  nº 10.257/01 do Estatuto da Cidade.
O acompanhamento do processo tem sido permeado por grandes dificuldades no que tange à participação da sociedade, devido, principalmente, ao fato de não estarmos sendo ouvidos nas propostas que justificadamente apresentamos aos responsáveis pela Revisão do Plano Diretor III, contratados pela Prefeitura de Valinhos, a Consultoria Geo Brasilis.
O último encontro se deu a pouco mais de 4 (quatro) meses, quando mais uma vez ouvimos todas as explicações da contratada e voltamos mais uma vez a apresentar propostas que inclusive estavam sendo também apontadas pelo Promotor Dr. Rodrigo Sanches Garcia, do GAEMA. 
Isto porque alguns estudos vêm apontando para o risco de exclusão de parcela significativa da 
sociedade do processo de comunicação feita por meio da Internet prejudicando o princípio da participação democrática. Nesse sentido, Lucas Vieira afirma que: 
“Uma pesquisa recente da Pew Research Center mostra que 17% dos adultos no Brasil não têm acesso a qualquer tipo de tecnologia móvel e 33% têm um aparelho móvel não inteligente”. [1]  
Este fator se deve, principalmente, a questões financeiras, onde:
De acordo com estudos do Sebrae, em algumas regiões do Brasil existem diferenças de até 44,5% na renda per capita entre os cidadãos das capitais e regiões.”[2]
 Em Valinhos, para uma população de 106.000 habitantes, o percentual da população com rendimento nominal mensal per capita de até 1/2 salário mínimo, segundo o IBGE (2010) é de 27,5%, o que representa 29.150 pessoas.
Como se isto não bastasse, em nosso município essa realidade se agrava ao observarmos e analisarmos os dados disponibilizados pelo Ministério da Cidadania - Secretaria Nacional de Renda e Cidadania, onde no mês de maio de 20201.757 famílias foram beneficiadas pelo Programa Bolsa Família no município, sendo 4.710 pessoas, diretamente atendidas pelo programa. Estas famílias se encontram em condições de extrema pobreza, com um benefício médio repassado de R$ 159,19 por família.
Fica patente que essas famílias que estão na linha da pobreza, não têm recursos para terem à disposição serviços de banda larga de Internet ou um outro meio.
Ajunte-se a isto, a realidade de que temos uma outra parcela sem conhecimento tecnológico para navegar na Internet dentro de uma plataforma, onde possa analisar, sugerir, e até mesmo apresentar suas preocupações.
Desde a retirada, nesta gestão, da circulação do Boletim Municipal impresso, estamos apontando que uma parcela significativa da sociedade está sendo excluída do direito à informação, inclusive prejudicando a publicidade dos atos administrativos, como preconiza a Constituição Federal. Já a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), em seu art. 19, destaca que:
“[…] todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras.”[1]

Observatório dos Direitos à Comunicação, corroborando nosso pensamento, afirma que:
“Assim como os direitos sociais, econômicos e culturais significaram um avanço da liberdade rumo à igualdade, este movimento, embora tardio e com outras características, também acabou por desaguar na reivindicação pelo reconhecimento do direito à comunicação.”
“[…] Ao longo de décadas, a consolidação do direito à liberdade de expressão foi sendo acompanhada pelo surgimento de outros princípios jurídicos aplicáveis, entre os quais, o direito à informação (que inclui o direito de cada indivíduo em informarse informar, e ser informado).”

“[…] A concepção de direito à comunicação para além da liberdade de informação e de imprensa aparece de forma incontornável no Relatório Mac Brid, de 1983. O documento reforçou explicitamente a necessidade de reconhecimento do direito humano à comunicação como princípio jurídico.”

Conclui-se que, mesmo que alguns intelectuais definam a comunicação como Direito Humano no que tange ao direito de acesso ao espaço público, segundo o Observatório dos Direitos à Comunicação: [2]
“[…] julga-se que a melhor forma de definir o direito humano à comunicação, seja qualificá-lo como o direito à participação, em condições de igualdade formal e material, na esfera pública mediada pelas comunicações sociais e eletrônicas”.

Dada a grande importância da Comunicação como Direito Humano, afirma-se, sistematicamente, que em situações de doença e de violência, a prevenção mais eficiente é a primária, que passa, obrigatoriamente, pelos serviços de informação que são ofertados à população. A sociedade tem o direito de ser informada com linguagem clara, apresentando com transparência a situação da realidade em que vive.
Isto não se aplica apenas à saúde ou à violência, aplica-se, também,  a toda e qualquer situação onde direitos têm que ser preservados e garantidos como é o caso da Revisão do Plano Diretor III, onde a sociedade não teve instrumentos e meios de participação, dentro do  tempo hábil, para estudar, analisar e esclarecer possíveis dúvidas técnicas, apresentadas na minuta de revisão das leis, de tal sorte que se apercebesse, por exemplo, de uma série de alterações relacionadas às diretrizes norteadoras de construções de políticas públicas, diretrizes viárias, bem como parâmetros de uso e ocupação do solo diferentes das que foram apresentadas e discutidas durante os mais de dois anos entre o Poder Público/Empresa Geo Brasilis e a Sociedade, por ocasião da apresentação da proposta consolidada apresentada na Etapa 4 dos trabalhos.
 Este ponto, citado como exemplo, é apenas para caracterizar o quanto é grave a impossibilidade de se discutir e questionar dentro de um coletivo. Na atual situação de pandemia da COVID-19,  o povo está sendo deixado à margem de qualquer discussão e somente quem tem instrumentos, tanto de conhecimento quanto de recursos de equipamentos, pode se permitir comparar linha por linha o que a “Minuta de revisão das Leis do Plano Diretor de Valinhos – Lei Municipal nº 3841/2004 e Revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo – Lei Municipal nº 4186/2007”, apresentada pela empresa Geo Brasilis e disponibilizada no site da prefeitura em 04/06/2020, tem de diferenças, diferenças estas que têm que ser discutidas e referendadas também pela sociedade.
Estas colocações nos levam a refletir sobre a impossibilidade de se pensar sequer no chamamento de uma audiência pública, como desejo expressado em nota pública pelo Sr. Secretário de Planejamento e Meio Ambiente, seja por qualquer meio, já que a presencial está proibida e, via WEB, é excludente e anti-democrática, ferindo o direito à participação popular por todo o acima já exposto.
Ao pensarmos nas etapas finais da Revisão do Plano Diretor III de Valinhos, somado com os efeitos do momento crítico da pandemia que estamos vivendo, temos ainda um outro problema, que sob nosso ponto de vista deve ser considerado, pela repercussão que pode provocar.
Estamos em um ano eleitoral, onde elegeremos Prefeito/a e Vereadores/as e a Revisão do Plano Diretor III de Valinhos, que teve seu início em fins de 2016, está caminhando para as conclusões, etapa mais importante, em pleno período eleitoral.
E, já que é dito publicamente que vários dos/as atuais vereadores/as são pré-candidatos/as, deve-se considerar que correremos sério risco de que algumas propostas possam não vir a atender os interesses da coletividade (bem comum).
Não é nenhum segredo, portanto, e deve se considerar, ainda, que algumas discussões, por estarmos em plena pré-campanha e no clima eleitoral, podem ser prejudicadas na sua análise técnica, pela influência de interesses e compromissos de campanha, assumidos por aqueles que disputam e aqueles que os apoiam.
Assim sendo, melhor seria que as discussões finais entre o governo e a sociedade, inclusive futuros/as candidatos/as, envolvendo as mudanças necessárias na Revisão do Plano Diretor, ocorram somente após as eleições municipais.
Acreditamos ter apresentado todo um rol de argumentos que sustentam o nosso pedido para que Vossa Excelência, diante do exposto, tome as providências que julgue necessárias.
Sem mais para o presente, nos colocamos à disposição para esclarecimentos que se façam necessários. Aproveitamos para deixar nossos votos de elevada estima e distinta consideração.
Respeitosamente,
Valinhos, 10 de junho de 2020. 
        Armando de Souza Amaral
Presidente

Referências